terça-feira, 22 de janeiro de 2008

As alterações climáticas e o PNAC 2006 ...


A natureza, muitas vezes considerada, erradamente, como uma fonte inesgotável de vida e de recursos, foi tomada, também, como factor de produção submetido aos desígnios da produção económica; o interesse pela natureza reduziu-a então a uma dimensão utilitarista. O surgimento, recente, de preocupações com a vulnerabilidade e a finitude da natureza, põe em cheque essa visão utilitarista, evidencia a contradição subjacente a esse projecto de sociedade de liberdade e abundância.
Numa sociedade liberal a origem da democracia presume-se residir na sociedade civil porém, na realidade, é o poder concertado dos governos com as corporações que é determinante nas democracias neoliberais. O poder da sociedade civil confina-se à expressão do descontentamento ou da desobediência.
O problema da atmosfera e de alterações climáticas coloca-se, no fim do século XX, analogamente ao problema da terra e de uso do solo, no inicio do século XIX. Quer num caso quer no outro, o que está em causa é a relação do homem com a natureza, em que a actual formação social se confronta com limites naturais, por aí se confrontando com os seus próprios limites, posto que do ponto de vista marxista as esferas humana e natural coexistem e coevoluem. Hoje constatamos que temos de conviver com a nossa atmosfera como temos de conviver com o nosso solo: cuidando das suas reais capacidades de resistência e de regeneração, sem o que a produtividade de um e a habitabilidade do outro se tornarão barreiras ao progresso da sociedade humana ou até à sua sobrevivência a prazo.
Estamos perante um gigantesco desafio porque a economia global está alicerçada no uso das fontes de energia fósseis. O Protocolo de Quioto é um primeiro passo extremamente importante no sentido de reduzir as emissões dos países desenvolvidos. O cumprimento dos compromissos estabelecidos no Protocolo de Quioto não permitem estabilizar a concentração atmosférica dos GEE, de modo a evitar uma interferência antropogénica perigosa sobre o sistema climático. O protocolo prevê que, pelo menos sete anos antes do final do 1º período de cumprimento (2008-2012), as partes iniciem o processo da definição de um novo regime climático pós-Quioto. As negociações começaram efectivamente em 2005, mas apenas a UE tem revelado empenho em procurar integrar novas metas de redução das emissões.
O PNAC 2006 contém as medidas julgadas necessárias pelo Governo para assegurar o cumprimento do Protocolo de Quioto por Portugal. Sendo um instrumento de estratégia de redução das emissões dos GEE, integra um pacote de políticas e medidas para todos os sectores de actividade, tendo em conta a eficácia ambiental e o custo efectivo para a sua economia.
Apresenta-se como um documento eminentemente político, com uma base utilitarista, no qual certos aspectos deveriam ser corrigidos/melhorados permitindo uma visão mais holística o que potenciaria um combate mais integrado e horizontal a todos os sectores.
Para evitar impactes futuros muito gravosos das alterações climáticas a UE considera ser necessário evitar que o aumento da temperatura média global, relativamente ao valor pré-industrial, seja superior a 2º Celsius. Isto implica a estabilização da concentração do CO2 atmosférico entre 450 e 550 ppmv, o que impõe reduções das emissões globais de GEE da ordem de 15% a 30%, até 2020 e de 60% a 80% até 2050, tomando como base o ano de 1990. Não existe, contudo, ainda qualquer esboço de acordo, tanto no seio da União, como com os outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento, no sentido de viabilizar essas reduções.
De facto, as medidas de mitigação para o período pós-Quioto estão ainda profundamente indefinidas. Elas irão, porém, traduzir-se necessariamente por uma “descarbonização” intensiva da economia, que agravará o preço da energia fóssil e abrirá o caminho de transição para um novo sistema energético e para um novo modelo de desenvolvimento.