sexta-feira, 6 de março de 2009

Que escola para o século XIX?

Na viragem do milénio, parece generalizada a ideia de que a escola não formou adequadamente, em termos ambientais, os cidadãos que se encontram hoje em idade activa, sendo notória a necessidade de preparar as crianças e os jovens no sentido de um desenvolvimento sustentável. Nos últimos anos, e pela primeira vez na história do Homem, estamos a educar as nossas crianças e jovens para a vida num mundo cujo conhecimento do futuro é escasso, excepto que será caracterizado por substanciais e rápidas mudanças (Hodson, 2003).
Sendo a escola o lugar privilegiado das aprendizagens, onde se devem adquirir valores e promover atitudes e comportamentos pró-ambientais, torna-se urgente uma intervenção eficaz, ao nível da educação, na perspectiva de desenvolvimento sustentável, inverta a tendência actual (Teixeira, 2000). Esta intervenção requer a identificação, o diagnóstico e, sobretudo, a promoção de mecanismos resolutivos inovadores, em vez de receitas prontas a usar para os problemas ambientais emergentes (Sá, 2006.).
Transversal a tudo isto está a afirmação da sustentabilidade como elemento estruturante de um modelo alternativo, o qual pressupõe a proposição e consolidação de novos valores ecológicos, baseados numa cultura centrada no respeito pelo território como bem colectivo, na prevalência do consumo público sobre o privado e no combate a atitudes e práticas predatórias sobre os recursos naturais.
As transformações que daqui decorrem orientam-se para a promoção de uma estreita e desejável cooperação territorial, ampliando as conquistas sociais e ambientais. Da importância atribuída aos valores ecológicos desenvolve-se um novo conceito de cidadania, mais abrangente, a cidadania ambiental. Esta noção procura justamente introduzir a dimensão ecológica na esfera das interacções sociais e económicas, acentuando os valores que se prendem com o respeito e os deveres para com o território (Gaspar et al, 2000).
Tendo por base duas ideias anteriormente referidas, a de “cidadãos capazes e pensantes” e a de “sustentabilidade como elemento estruturante de um modelo alternativo”, acreditamos que é fundamental um processo de transformação:
· do eu: como forma de aumentar o conhecimento (através de processos de socialização e de inculturação) e através de processos de auto-exame.
· da escola: ao nível do currículo; do clima de sala de aula/escola (relativamente a questões sobre autonomia, cooperação e participação); e da valorização da escola na comunidade.
· da sociedade: promovendo uma cidadania mais democrática e a redefinição do sistema do valores que conduza a uma “economia que pensa a Terra” (Marques, 1994) criando assim os alicerces da sustentabilidade planetária.
Tendo como requisito a expressão de Marques (2005a) quando refere que a crise ecológica implica um pensamento que não tenha medo de sujar as mãos no barro do quotidiano, um pensamento que tenha alento suficiente para a luta de titãs que nos separa da difícil vitória sobre os inimigos mortais da nossa civilização, pretendemos reflectir acerca da nossa visão de futuro para a escola. Esta baseia-se na necessidade de transformação da escola e da sociedade, pelo que, apresentamos de seguida alguns aspectos que consideramos fundamentais para a construção e consolidação dessa nossa visão.
Numa altura em que se procura um modelo de gestão e exploração da natureza baseada na autopreservação e na responsabilidade pelo futuro dos seus semelhantes, qualquer reflexão sobre o papel da instituição escolar deve ter na origem um pensamento alimentado pela ética ambiental. A actual questão ecológica remete-nos para um novo estágio da consciência mundial: a importância da Terra como um todo.
Como refere Caride e Meira (2001) o afastamento do efeito directo das acções individuais sobre a qualidade do ambiente, a saturação social e comunicativa dos objectos comuns, as contradições entre o que é anunciado e o que é vivido, a complexa genealogia social e ambiental dos bens de consumo, o carácter contra-factual dos perigos contemporâneos que enfatizam a sua irrealidade, constituem outros factores que virtualizam o cenário para a acção ética. O carácter muitas vezes indutivo dessa acção, nascida de questões levantadas por situações tecnonaturais concretas, e o seu contexto dedutivo implicado pela aceitação de princípios morais desejavelmente universais implicam sempre o sujeito, exprimem-se através dele e projectam-se como objectivos para a sua acção. Parece-nos portanto indispensável ligar à compreensão dos fenómenos “externos” (como a tecnonatureza, o património e a cultura, etc.) uma compreensão alargada do sujeito e da função expressiva da linguagem (Lencastre, 2006).
Acima de tudo, a ética de que precisamos, uma ética do futuro e para o futuro, será certamente uma ética de responsabilidade, não apenas no sentido de Hans Jonas, mas também na acepção de Max Weber, em que a ética da convicção tem de ser sopesada pela ética da responsabilidade. Se há hoje um antropocentrismo que justifique um investimento intelectual, ele é o da responsabilidade (Marques, 2003).
A cidadania para o século XXI requer uma educação baseada numa ética que reconheça a condição humana de tal forma que os indivíduos sejam controlados pela sociedade onde vivem e este exerça controlo sobre os primeiros. Esta ética não se baseia em lições de moral, mas antes na compreensão que cada pessoa é apenas um elemento de um todo maior: seja a sua espécie, a sociedade onde vive ou o próprio planeta. Um efectivo desenvolvimento humano requer uma autonomia individual, participação comunitária e respeito pelas gerações futuras (Morin, 1999b; Gaudiano, 2003; Gadotti, 2008b).
JGomes

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